Reserva da Antologia Pessoal: novembro 2010

SEM ANULAR-ME


Leonard Zelig
Entre um riso e outro,
Um camaleão...

Sentados,
Eu, meu egoísmo e Allen

Enquanto a janela
Projetando imagens
Ensinava-me a não agradar aos outros

SAUDADE

A saudade é algo que dói
trazida pelo tempo
e pela distância.

Distância que provocamos
ou que somos vitimas.

DE TÃO TRIVIAL TORNA-SE INVISÍVEL

Eu com as idéias na mão
Observava as duras sementes
Continentes de significados
Sementes haikais

Compacto e calado

Mirei o homem
Que tomava refrigerante
Para livrar-se do que não conseguia engolir

E quando desviei o olhar
Enquadrei, sem zoom,
A adolescente que pedalava
No outro lado da rua
Com voluptuosidade comum

Impacto ignóbil
Único

O grito torpe do cafajeste
“é muita areia pro meu caminhãozinho!”
Tirou-me o foco da lente

SOLDADOS DAS FLORES

Não reclamem do espinho
do espinho da flor
defesa da flor
vejam o sofrimento
do espinho sozinho.
Flor com flor
novos florais
espinhos não se cruzam
talvez para não formarem outros...
são condenados
à sofrerem só.

NO DICIONÁRIO

                   QUARTÃ chegou ardente

                       numa QUARTA-FEIRA

                    no outro lado do QUARTEIRÃO

                    frente ao QUARTEL
                    QUARTEL-GENERAL
                   um QUARTETO cantava
                    a QUARTINHA
                    que estava no QUARTO
                  QUARTO-DE-MILHA era o cavalo
que se chamava QUARTZO
                e também estava lá QUASE cantando
                 num compasso QUATERNÁRIO
                 falando do QUATI
                   comendo QUATORZE aves
                   durante um QUATRIÊNIO
                             um QUATRILHÂO ouviu aquela música
                  dos QUATRO cantores
                 QUATROCENTOS colibris
                            foi o nome QUE deram à música da retreta

LÍNGUAS VIGILANTES

Desmancha-se na boca
açúcar
de pele áspera
o ácido abacaxi
fitando o jambo
de quem todos desejam
a morenidade
enquanto limão e tamarindo
azedos
atrapalham o romance
invejado

DESENHOS

Delírios
eventuais
sedentos de ti
entram em mim
numa velocidade quente

Herméticos, os olhos estiveram
a ver o invisível momento

Sede nas bocas
enquanto palavras e delírios desenhávamos

BOCA

           Boca
emergia no corpo
lambendo
           bebendo
elástico desejo
límpida sensação da carne.

PROPOSITAL

Quando sentires falta do inicio
                                ou do fim
é porque só me interessa
mostrar o meio.

NÓS

A luz
gotejava
sobre a grama
enquanto a água
fazia brilhar
teu corpo sereno
quando o sol
já havia se retirado
sem querer testemunhar
tua língua
sugando meu suor
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